A saúde pública no Rio Grande do Norte atravessa uma crise considerada “fora de controle”, segundo Geraldo Ferreira, presidente do Sindicato dos Médicos do RN (Sinmed-RN). A declaração foi feita em entrevista coletiva realizada nesta quarta-feira (27), onde a entidade expôs a situação grave que envolve atraso no pagamento de honorários desde julho deste ano, atingindo mais de 50% dos médicos, falta de diálogo com gestores e escassez de profissionais, resultando em uma sobrecarga no sistema. "Pode haver uma greve generalizada agora no mês de dezembro. Esta é a grande articulação que o Sindicato está fazendo como uma forma de pressionar a Justiça, o Ministério Público, os Tribunais e os gestores", relatou Ferreira.
O Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, principal referência em urgência e emergência do estado, foi descrito como um “retrato do caos”. Ferreira alertou que há risco iminente de colapso em setores essenciais do hospital, como anestesia e cirurgia geral. “A carga horária está sendo redistribuída de forma inadequada, comprometendo desde a preparação anestésica até o acompanhamento no pós-operatório”, explicou o presidente do Sinmed-RN.
A crise não se limita aos serviços médicos, afetando também áreas como alimentação e fornecimento de insumos básicos. Ferreira projeta que, sem medidas corretivas urgentes, o final do ano será ainda mais caótico, com um risco iminente de colapso total no atendimento ao paciente. "Corremos o risco de um colapso completo na assistência ao paciente", alertou.
Falta de infraestrutura e longas filas de espera
Durante a visita ao Walfredo Gurgel, foi observado que mais de sete ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) estavam paradas em atendimento. Francisco das Chagas, vice-presidente do Sinmed-RN, destacou que a crise afeta diretamente os pacientes. “Temos pessoas que quebram o braço e ficam meses esperando uma cirurgia, pacientes em corredores superlotados e até falta de comida para acompanhantes”, relatou.
Apesar das dificuldades, os médicos continuam lutando para atender à população, mas as condições de trabalho pioram a cada dia. "Eu nunca vi algo tão grave em 45 anos de profissão", desabafou Ferreira, visivelmente emocionado.
Propostas para solução da crise
Para Geraldo Ferreira, a construção de novos hospitais e a nomeação de novos profissionais são essenciais para ampliar a capacidade de atendimento. Ele também ressaltou a necessidade de um trabalho de conscientização sobre os acidentes de trânsito, que geram uma média de 30 casos por dia, aumentando significativamente a demanda, especialmente no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel.
Crise também afeta municípios do interior
Nas cidades do interior, a situação também é grave, com hospitais e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) sem infraestrutura adequada. Francisco das Chagas relatou que, em algumas localidades, há falta até de medicamentos básicos, como remédios para vômito. “Passamos por corredores superlotados, vendo pacientes que deveriam ser operados, mas não conseguem atendimento”, lamentou.
Além disso, o atraso nos pagamentos a cooperativas e empresas terceirizadas também é um problema recorrente. Em Mossoró, por exemplo, pendências com três Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) no Hospital Tarcísio Maia somam R$ 432 mil para julho e R$ 392 mil para agosto, com previsão de pagamento para dezembro. "Gastamos boa parte do dia aqui no Sinmed atrás de receber honorários médicos atrasados", afirmou Ferreira.
Greve geral como última alternativa
Com a situação de inadimplência e precarização, o Sindicato dos Médicos não descarta a possibilidade de uma greve geral em dezembro. "Estamos articulando uma mobilização com os médicos que trabalham para cooperativas e empresas terceirizadas. Se não houver uma solução imediata, essa será a única forma de pressionar por mudanças", afirmou o presidente do Sinmed. O Sindicato já solicitou audiências com o Tribunal de Contas, o Ministério Público e a Federação dos Municípios para buscar intervenções que evitem o agravamento da crise.
A estimativa do Sinmed é que a saúde pública do Rio Grande do Norte conta com mais de 6,5 mil médicos, sendo cerca de 50% ainda aguardando a quitação de pendências. Apenas os débitos com a Coopmed e os profissionais de saúde superam R$ 10 milhões.
Profissionais de saúde pedem convocação de aprovados no concurso de 2018
Além das questões salariais e de infraestrutura, profissionais de saúde também se uniram para pedir a convocação dos aprovados no cadastro de reserva do concurso público de 2018. Sônia Godeiro, organizadora do ato, explicou que a necessidade de novos profissionais no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel é urgente, especialmente com a retomada dos leitos do segundo andar da unidade.
"Aqui no hospital existe a necessidade de termos 27 enfermeiros, três fisioterapeutas e dois farmacêuticos", afirmou Sônia. Embora haja mais de 300 pessoas aguardando na lista de reserva, as vacâncias estão sendo ocupadas por contratos temporários, que podem ser cancelados a qualquer momento, comprometendo o atendimento aos pacientes. João Batista, enfermeiro que aguarda a convocação, destacou a importância dessa medida para a melhoria do estado: "Acredito que com essas convocações vamos trazer a nossa contribuição e melhoria para a saúde do estado", concluiu.